Editorial - Junho de 2014
Hoje, está na moda falar de tradição e fontes orais. O mesmo não acontecia, no século XIX. As fontes orais estavam descartadas, na construção do conhecimento histórico, por supostas fragilidades, de que enfermam e, sobretudo, pelo preconceito dos que antes chamavam só para si a construção deste conhecimento.
Sabe-se que Auguste Comte e os positivistas, Leopold Ranke e os historicistas, os obcecados pela escrita, não queriam ouvir falar das fontes orais, e chegavam mesmo a dizer que um povo sem escrita é um povo sem história. Todavia, as coisas mudaram, com as revoluções metodológicas verificadas no século XX, no campo da ciência histórica. Encabeçou essas revoluções a Escola dos Annales , e as fontes orais passaram a figurar como um ingrediente válido para o “prato” da História.
Talvez seguindo esses ventos de mudança, a Fundação Contos para o Mundo decidiu mergulhar no mar da oralidade moçambicana, para nele pescar as histórias que o habitam. Esta oralidade é parte da cultura dos moçambicanos, mas tende a ser vandalizada pela modernidade, e os seus portadores reduzidos a nada, por não dominarem o idioma português.
A Fundação Contos para o Mundo, com a sua missão de resgatar a tradição oral moçambicana, vem mesmo a calhar. Talvez isso possa conduzir muitos jovens moçambicanos ao seu próprio chão. Talvez isso sirva de privilegiada fonte de inspiração para os inúmeros jovens escritores, que, ultimamente, tanto se esmeram para aprender o idioma oficial, mas que, depois, ficaram sem histórias para contar, refugiando-se na poesia.
Portanto, é urgente que escritores moçambicanos, sobretudo os mais novos, acobertados ou não por famigeradas instituições, procurem preservar a tradição oral, ouvindo e escrevendo os inúmeros episódios dela. Ainda, esses jovens escribas podem aproveitar a forma de contar dessas histórias, sempre feita com algum didactismo e invejável beleza.
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